Momento da Sinceridade
por
Luiz Roberto Londres
A crítica dura acirra ânimos. Não faz mal. Minhas considerações não são de ordem pessoal. Não gosto de sua atuação na função em que se encontram. Não me sinto representado.*
A crítica dura acirra os ânimos, é verdade. A tendência, nesses casos, é uma reação quase imediata e irrefletida da outra parte. Na maioria das vezes não é indicada, vale mais uma colocação que faça o outro refletir e não simplesmente reagir. Mas há momentos em que esse tipo de colocação suave suscita, na outra parte, nada mais do que comentários vazios e um dar de ombros com algum incômodo, tentando aparentar um desdém.
Pois bem, acredito que a nossa sociedade está chegando a um limite do seu tratamento cerimonioso, diplomático ou político. Há tempos ouvi uma frase que, com pequenas modificações, pode ser aplicada à realidade da vida: "Os meios tendem a se tornarem fins em si mesmos." Olhamos a nosso redor e vemos isso acontecer. As missões das instituições estão se apagando, em função dos interesses particulares - sejam esses dos proprietários ou dos gestores.
Alguns setores de finalidade eminentemente social se perdem na busca de números. Vemos um Jornalismo moribundo - ou morto, segundo a Revista Imprensa - interessado apenas em venda de exemplares, índices de audiência, anúncios e patrocinadores. A eles vendem a sua missão de informar e esclarecer. Vemos uma Medicina cambaleante, vendida a interesses de intermediários e fornecedores de materiais - Hipócrates está sendo esfaqueado pelas costas. Vemos uma Educação apagada, fragmentada, a formatar em vez de formar pessoas.
Mais grave e mais gritante fica essa situação quando passamos à esfera pública ou mesmo de coletividades. Em quase todos os seus níveis vemos a apropriação de postos ou entidades que deveriam servir a terceiros para que representantes se sirvam desse postos ou dessas entidades. Associações e sindicatos passam a ter donos, ou seja, dirigentes "vitalícios", valendo-se do cargo para proveito próprio. Além disso, através de manobras escusas, se reelegem por diversas vezes ou "impõem" seus sucessores.
Chegamos, finalmente, aos "donos do poder" que, em uma real democracia, nada mais são que os representantes do verdadeiro detentor do poder - o Cidadão. A noção atual de Autoridade mostra o distanciamento que existe entre a teoria da Democracia e a prática na qual vivemos. O poder do cidadão se limita a uns parcos minutos em que deposita numa urna o seu voto. Freqüentemente o eleitor mal se lembra em quem votou. Isso sem falar em votos comprados que se aproveitam da inconsciência da população. E dizem - pior, achamos - que isso é Democracia.
Vemos, acomodados e inertes, a manipulação da qual somos vítimas.
Vemos o esgarçamento do pensamento e das ações verdadeiramente sociais.
Vemos as leis oportunistas que beneficiam uns poucos.
Vemos os comportamentos imorais e impunes de altíssimas figuras do poder.
Vemos os desmandos que fazem com nosso dinheiro.
Vemos, apesar disso, a sua continuidade nos cargos que ocupam.
Sim, passamos de protagonistas a meros espectadores de nossas vidas. Se quisermos reverter esse quadro, é fundamental que tenhamos acesso a um sentimento que está adormecido e que o coloquemos para fora com todas as nossas forças em todos os momentos em que isso for possível. E é imprescindível que esse sentimento passe à ação e que fique claro que todos os nossos representantes saibam e sintam na pele que, pelo seu comportamento e pelo seu desinteresse em relação às suas missões, Não me sinto representado.
*Palavras de Ronaldo Gomlevsky, editor da Revista Menorah.