Acusações e Leviandades
por Luiz Roberto Londres
Gostaria de fazer um breve resumo a respeito de transplantes no estado do Rio de Janeiro. Há pouco menos de 15 anos, nosso histórico de transplantes de coração e fígado era pífio: apenas 1 de cada. No ano de 1994, a Clínica São Vicente criou um programa intitulado Gávea Transplante, que foi coordenado pelo Dr. Eduardo Rocha e, após quase um ano de preparo institucional, iniciamos transplantes de coração, com a equipe do Dr. Ricardo Miguel; e de fígado, com a equipe do Dr. Joaquim Ribeiro Filho. A meta de todos nós era o incentivo para a prática de transplantes em nosso estado.
Este mesmo Dr. Joaquim Ribeiro Filho, conhecido e respeitado no meio médico, foi preso pela Polícia Federal sob fortes acusações, como peculato, estelionato e enriquecimento ilícito. Notícias publicadas em diversos órgãos da imprensa envolveram não só médicos, como instituições tradicionais, de seriedade incontestável. Outros médicos respeitados - alguns já professores, outros no início de sua vida profissional - estão tendo seus nomes envolvidos em escândalos ainda não esclarecidos, em versões de fatos não condizentes com a realidade, em distorção de informações.
Não tenho procuração de nenhum desses médicos para defendê-los, e a única afirmação que posso fazer é que não tenho, nem têm todos os colegas consultados, qualquer dúvida a respeito da conduta dos referidos profissionais. Qualquer levantamento que os comprometa seria uma grande surpresa para todos nós. Temos plena confiança nas duas equipes oficialmente credenciadas para realizar transplantes de fígado em nosso hospital: a do Dr. Joaquim Ribeiro Filho (Hospital Clementino Fraga Filho) e a do Dr. Lúcio Pacheco (Hospital Geral de Bonsucesso).
Desde então temos regularmente efetuado esse tipo de cirurgia para órgãos e tecidos. Em momento algum a Clínica São Vicente teve qualquer participação na determinação do destino de um órgão; a captação e transporte de órgãos é atribuição do Rio Transplante vinculado à Secretaria Estadual de Saúde. À instituição hospitalar cabe apenas oferecer suas instalações e equipe de apoio. O único órgão que não veio através da entidade oficial foi o fígado de um transplante realizado em julho de 2007, que estava acompanhado de uma liminar endereçada a diversas Centrais de Transplantes do Brasil, entre as quais a do estado do Rio de Janeiro.
No estado do Rio de Janeiro, há problemas desde a captação. No mesmo ano de 2007, acompanhamos o caso de uma paciente que deu entrada com evidências de morte cerebral, não apresentando qualquer impedimento para a retirada de seus órgãos. Esta pessoa havia manifestado em vida a vontade de ser doadora de órgãos e seu marido estava preocupado em seguir esse desejo. Diversas solicitações frente ao Rio Transplante esbarravam em posições incompatíveis com o conhecimento médico e quase impediram a realização do último desejo de uma pessoa condenada à morte.
Cabe lembrar que, segundo a Constituição Federal, em seu artigo 196, "saúde é um direito de todos e dever do Estado". Cabe, portanto, a nós, cidadãos, questionarmos a saúde pública de nosso estado, que era, há menos de 30 anos, considerada a melhor do país.
Cabe a nós, médicos, mostrarmos que Medicina, muito mais do que empresas, projetos ou leviandades, está centrada no trabalho de um profissional em contato com alguém que necessita de sua ajuda.