Especialista sugere uma 'negociação' do tratamento: Para Luiz Roberto Londres, paciente não deve ser tratado com base em recomendações gerais
(20/9/2002 | O Estado de São Paulo)
LÍGIA FORMENTI
Seu médico prescreveu uma dieta rígida para combater o colesterol e, de quebra, mandou fazer uma atividade física que você odeia? Se você aceitou isso calado, cometeu um engano. "O paciente tem de se considerar como um rei. Dizer quais são seus gostos, suas preferências, para chegar ao meio-termo com o médico", defende o diretor da Clínica São Vicente, Luiz Roberto Londres. "O certo está no equilíbrio: não nas normas rígidas do médico nem a liberalidade excessiva do paciente", completa.
Londres, que há tempos deixou de atuar como cardiologista para estudar a filosofia da medicina, nota que há uma tendência em tratar pacientes com base em recomendações gerais. O colesterol está alto? Então diga nunca mais à manteiga. Você está próximo dos 40 anos? Abandone o futebol e passe a caminhar, que é mais seguro.
"Até hoje, não há nenhum estudo que demonstre, por exemplo, que uma pessoa que risque para sempre a manteiga esteja mais protegida, por exemplo, de quem comeu uma vez a cada 15 dias", argumenta. "Não somos digitais. Precisamos fazer uma adequação entre o prazer e as recomendações."
O cardiologista é o primeiro a seguir a filosofia do meio-termo. Aos 61 anos, ele tem colesterol alto. Diminuiu muito o consumo de carnes vermelhas, percebeu que a manteiga pode ser evitada. "Mas não hesito em comer o que gosto, de vez em quando", confessa. Também toma medicamentos, diariamente.
"Não brigo com a ciência. Apenas dou valor também ao prazer."
Terrorismo - Londres não descarta a importância dos estudos científicos. Os resultados, porém, têm de ser vistos com cautela e não alardeados com terrorismo: "A ciência muda a cada dia. Novos conhecimentos têm de ser avaliados, adaptados a cada caso, não serem transformados em padrão de vida."
Para o paciente, ele ensina: "Converse com o médico, argumente. Veja o que tem de ser seguido, o que pode ser tolerado."
Essa tática simples, completa ele, é uma garantia tanto da adesão ao tratamento quanto da manutenção dos prazeres. "A relação médico-paciente não tem de ser de obediência absoluta. Pode ser também de negociação."
Para Londres, o bom resultado do tratamento começa com a consulta do médico.
"Alguns podem ser mais técnicos que outros. Mas, no consultório, o diálogo, examinar a alma do paciente, é o primeiro passo para o bom resultado da terapia." E isso, completa, muitas vezes descarta a necessidade de exames complementares. "Para que fazer um hemograma, por exemplo, se podemos checar se o paciente tem anemia examinando o tecido da conjuntiva? Ou um teste de coagulação, se a pessoa não tem sangramento nem mesmo quando escova os dentes? Mais uma vez, é uma questão de bom senso."
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